Fotos de
Joel Marinho
Por Fernando GABEIRA
“Dona Olímpia, ao perceber, nas primeiras décadas de sua vida, que não ia mesmo se casar, caiu no mundo. Teve forças para ignorar a pressão da sociedade que a envolvia, mas resolveu ver de perto. Roupa? Era simples. Bastava inventar, usando um vestido sobre o outro. Horário? Para que, se o frio e o escuro lhe indicavam a hora de dormir e a ligeira pontada no estômago lembrava que tinha fome?
Passou a andar com um cajado na mão, o rosto muito pintado e o chapéu de uma antepassada. A cidade é feita de becos, ruelas e ladeiras. Ela subia e descia, chegando às vezes lá no alto, na Igreja de Santa Ifigênia. Apesar do cajado, do olhar em fogo, ela não pregava nada, nem falava em melhorar a vida na terra. E a ladeira é algo estranho, que desafia mesmo os seres chamados normais. Sim, porque a cabeça chega em cima muito antes das pernas, de forma que cada ladeira é um mergulho no inconsciente, um deliberado abandono do corpo, condenado a repetir mecanicamente o mesmo gesto."
ATHAYDE, P.
Detalhe de Primavera,
OST, 2007.
Olímpia: Obra de Chiquinho de Assis gravada pela Orquestra Experimental da UFOP para o filme Compositeurs de hier et d'aujourd'hui de Luc Riolon. Uma produção 24 images, América Mundi Filmes e Rede Minas.